O educador, para ser fiel ao espírito das matemáticas contemporâneas,
deve considerar o pensamento matemático como um prolongamento das construções
espontâneas da inteligência e recorrer, assim, aos ensinamentos da Psicologia tanto como da Lógica
(...) O objeto do ensino da Matemática será sempre alcançar o rigor lógico e a
compreensão de um formalismo suficiente. Somente a Psicologia está em condições
de proporcionar aos pedagogos dados sobre o modo de conseguir, com maior
segurança, este rigor e este formalismo. Nada prova que colocando o formalismo
a princípio o encontramos ao final. Porém, os estragos de um
pseudoformalismo
por ser demasiado precoce, mostram os perigos de um método que ignora as leis
do desenvolvimento mental. (Piaget apud Rangel, 1992)
Kamii
discute as utilidades da pesquisa e da teoria de Piaget contribuindo para que o
professor em sala de aula saiba propor o ensino de número. Um ensino que
desenvolve a autonomia social, moral e intelectual do aluno, fazendo com que o
aluno tenha uma maior consciência de si mesmo.
De forma
breve enfocaremos a natureza do número da obra de Kamii, para melhor
interpretarmos as respostas dos alunos, e criarmos um trabalho com os
educadores da escola estadual de Mosqueiro (PA).
Como se
inicia o processo de construção do número?
Esta
pergunta nos fez acessar e redescobrir as fontes naturais de observação, e as
abstrações empíricas e reflexivas. Tais ações nos possibilitam desconstruir o
conceito de número. Para Rangel (1992), a Matemática deve priorizar a construção
dos conceitos pela
ação da criança, através de sua experimentação
ativa, para posterior formalização
destes conceitos através da linguagem. E segundo Piaget, suas experiências se dão no nível social e no nível
físico. Enunciaremos aqui os três tipos de conhecimento:
- conhecimento físico, a criança entra em contato com um objeto e observa suas propriedades
físicas (cor, tamanho, forma, peso, textura etc.);
- conhecimento social, a criança entra em contato com as convenções de um objeto, uma
linguagem, ou seja, não existe razão física ou lógica que o justifique. Os
conceitos lhe são ensinados através de transmissão social, como por exemplo,
quando lhe ensinam a contar;
- conhecimento
lógico-matemático, a criança entra em contato com mais de um objeto ou com
conjuntos de objetos. Esse conhecimento se relaciona com as propriedades das
ações e não apenas dos objetos, e por isso ela passa a coordenar relações entre
os objetos (igual, diferente e mais).
As duas primeiras
formas de conhecimento possuem fonte parcialmente externa ao indivíduo, mas que
o terceiro é proveniente da criação do indivíduo, isto é, não é observável por
só existir na cabeça da criança.
Nas
relações entre conjuntos de objetos, os sujeitos observam que eles podem ter
algo diferente ou algo em comum, ter algo a mais ou a menos que o outro. E o
número provém dessas relações construídas, é algo criado mentalmente pelo
sujeito.
O
conhecimento é proveniente das experiências que o sujeito estabelece em seu
meio. Como se constrói o conhecimento físico e lógico-matemático, já que o
conhecimento social é transmitido arbitrariamente?
Através da
abstração reflexiva e empírica, que são interdependentes.
- abstração empírica é quando a criança abstrai uma propriedade de um objeto e ignora as
outras (cor, tamanho, forma, peso etc.);
- abstracão reflexiva é quando a criança relaciona diferentes objetos ou conjuntos,
comparando suas diferenças e semelhanças.
Durante os
estágios sensório-motor e pré-operacional (segundo a Teoria de Piaget, esses
são os estágios iniciais do desenvolvimento humano, que estabelece os períodos
de 0 a 3 anos e de 3 a
6 anos, respectivamente), a abstração reflexiva ocorre,
dependentemente, da abstração empírica, a que advém dos processos de
experimentação, ou seja, das relações dos objetos. Com o tempo ela transcorre
sem depender da empírica, as experiências passam a ser formais, e a linguagem
transmite e traduz os sinais operatórios.
A criança
deve colocar todos os tipos de conteúdo (objetos, eventos e ações) dentro de
todos os tipos de relações para chegar a construir o número.
Inicialmente,
os números são aprendidos pela abstração empírica e à medida que a criança vai
construindo relações entre conjuntos de objetos e figuras.
Para
Piaget, o número é uma síntese de dois tipos de relações: a ordem e a inclusão
hierárquica.
Antes de
quantificar os objetos, as crianças colocam-nos em uma ordem. Esta organização
pode ser feita espacial ou mentalmente. E para quantificar os objetos como um
conjunto, as crianças os englobam, ou seja, colocam tais objetos em uma relação
de inclusão hierárquica.
Referência
RANGEL, A. C. S. Educação matemática e a construção do número pela criança: uma experiência em diferentes contextos socioeconômicos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.
Nenhum comentário:
Postar um comentário