A fome e a vontade de comer. A alimentação necessita da mastigação. Agressividade e agressão residem e se diferenciam em nossos hábitos desde pequenos.
A mulher amorosa. O homem agressivo. Mulher mimada. Homem sai de casa. Homens mimados e mulheres que saem de casa? Violência secundária patógena. Agressão mascarada. Tanto a indiferença como o rechaço contribuem para mais violência.
Como expulsar os mandatos dos papéis masculinos e femininos e nos autorizar a conhecer? Quem de nós não foi agredido quando criança? Coisas do inconsciente coletivo ou do poder simbólico.
As mulheres assistem. Os homens perguntam. Curioso é o cientista, inteligente, perspicaz. Curiosa é a fofoqueira, intrometida, intrigueira. E os homens apresentam mais dificuldade de aprendizagem. O modelo de bom aluno parece se ajustar mais às mulheres.
Quem pergunta? Aquele que contraria, contradiz, discute, retruca. Segundo Alicia Fernandez (2001, p.121), “perguntar, questionar e mostrar o que se passa requer um quantum de agressividade e um projeto identificatório”.
- Qual o modelo interno que cada professor tem do bom aluno? O que aprende, investiga e resolve problemas ou aquele que aprendeu a ser obediente, submisso e passivo – mas, qual é o mais valorizado na práxis?
Agressividade, aprendizagem e criatividade estão relacionadas. Pulsão criativa vem do inconformismo com a realidade. Desejos incontestes. O que move o aluno a aprender? O que move a aluna? Qual o papel representado?
A atuação agressiva não pode impedir a gestação de um espaço de pensamento. Eu tenho paixão por aprender, e isto quer dizer que adoro fazer perguntas. Sou agressiva ou sou poeta? Necessito de espaços de respiração. Fruição.
Com Freud, nos estudos psicopedagógicos, descobri a palavra epistemofílica e entendi melhor a pulsão epistemofílica, ou seja, a busca prazerosa pelo conhecimento, assim pequenina aos poucos fui me diferenciando de alguns colegas na escola. Eu gostava da escola.
Repito aqui palavras de Georges Snyders (1988): “você não estuda na escola, não pode imaginar de que satisfação está se privando” (p.12). Mais ousadia é dizer ainda com ele e como ele: “na escola, trata-se de conhecer alegrias diferentes que as da vida diária; coisas que sacodem, interpelam, a partir do que os alunos mudarão algo em sua vida, darão um novo sentido a ela, darão um sentido a sua vida. Se é preciso entrar na classe, é porque, no pátio, vocês não atingem o grau mais elevado de liberdade, nem de alegria” (p.14). Sublime. A leitura e o conhecimento nos fazem viajar e propor novas alegrias.
Assim entendo a escrita, que deve ter sentido para aquele que escreve assim como para quem a lê. Ambos buscam o significado, o substantivo, a ação, o encontro, o desencontro, novos caminhos.
O que favorece a curiosidade epistemofílica? Também me lembrei do filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, do diretor Peter Weir, e da palavra “carpe diem”. O ócio criativo. As alegrias culturais. Da energia agressiva a nos tirar do lugar, a nos inquietar e no tempo de busca recriar o mundo, reinventar-se nele, fazer as coisas a partir do estado de espírito, dos corpos que se relacionam, dos objetos e seus novos significados. Suavizar as linhas tensionais. Mudar o hábito. Mudar o pensamento. Só sei que nada sei. Aproveite o dia!
Desde que assisti pela primeira vez a esse filme, no início da década de 90, fiz anotações de algumas falas importantes e do diálogo do professor com seus alunos a subir nas cadeiras com ele. Transgressão?
Diz o professor apaixonado que faz com que seus alunos possam criar seus versos e a vida tenha mais sentido, sentidos que dão alicerce à alma e que não pode ser pequena:
- Oh! Capitão, meu capitão! Walt Withman escreveu em homenagem a Abraham Lincoln. É assim que eu quero que vocês me chamem.
...CARPE DIEM, gozem o seu dia, juntem os botões de rosa enquanto estão vivos, um dia todos morreremos. Aproveitem a vida, tornem-na extraordinária!
...Isto é uma barricada, uma guerra. Exponham seu coração! A guerra é um ato acadêmico, medindo a poesia, nada de métodos.
...Na minha aula vocês vão aprender a pensar por vocês, não importa o que as pessoas digam, palavras e idéias não mudam o mundo!!
...Tenho um segredo para contar a vocês! Aproximem-se:
- Não escrevemos poesias porque é bonitinho; lemos e escrevemos poesias porque somos parte da raça humana e a raça humana é repleta de paixão. E medicina, direito, engenharia e administração tem outro objetivo: o de sustentar a vida. Mas, a poesia, a beleza, o romance, o amor é para o que vivemos, para entender Withman ou a mim. A vida pergunta como acontecem cargas de fracassos, cidades cheias de bobos. A resposta é que vocês estão aqui. Que a vida e vocês existem. Que o poder do jogo continua e vocês estão nele. Que o poder continua e vocês podem contribuir com um verso.
- Qual seria o seu verso?
Encontro de novo em Snyders, a combinatória semântica, “minha escola: uma alegria que brota de um encontro com as obras de arte, desde os grandes poemas de amor até as realizações científicas e técnicas, de uma tensão em direção aos mais realizados sucessos humanos, de uma participação, de um certo modo de participação nos movimentos organizados pelo que os homens se esforçaram para progredir em seus estilos de vida. Gostar de um texto, compreender como funciona o motor, apreender o que é capitalismo, o socialismo, o Terceiro Mundo... começar pelo menos a apreendê-lo, na aproximação, mas também as sementes da realidade de que cada idade e cada aquisição anterior permitem; agir a partir dessas aquisições fortificando-as pela ação, enraizando-as na ação. Alunos que vivem no nível dos ideais, dos valores”.
Paul Éluard, por Pablo Picasso (1941) "o poeta da liberdade" |
Também, a escola me conquista porque sei que “não é preciso de tudo para fazer um mundo. É preciso felicidade e nada mais” (Paul Éluard, 1895-1952).
Ser crítico ou opositor não é ser alegre e gentil? Uma coisa é a agressividade (violência primária necessária, criativa, facilitadora) e outra é a agressão (violência secundária patógena, destruidora, aniquilante).
O bullying é um problema atual, e de outros tempos, problemas que se acumulam naqueles que não conseguem lidar com a agressividade, arrefeceram diante do conhecimento, não conseguiram ser feliz na escola, sem força para reverberar a violência, ou seja, deixar o feixe de luz passar por entre nebulosas. O agressor procura vítimas fáceis, que não reagem a seu modo, surpreendem-se com outras formas mais inteligentes de operar. Mais humanas e solidárias. A alegria precisa reverberar na escola. O agressor pode voltar a ser feliz.
“Quero a rosa mais linda que houver, a primeira estrela que vier, a paz de criança dormindo, as flores se abrindo, a alegria do barco voltando, a ternura de mãos se encontrando” (Dolores Duran).
Referências
FERNÁNDEZ, Alicia. A agressividade: qual o teu papel na aprendizagem? In: GROSSI, Esther. Paixão de aprender. Petrópolis, RJ: Vozes, 1992. (p. 168-180).
FERNÁNDEZ, Alicia. A agressividade e a aprendizagem. In: ____ A mulher escondida na professora: uma leitura psicopedagógica do ser mulher, da corporalidade e da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2001.
SNYDERS, Georges. A alegria na escola. São Paulo: Manole, 1988.
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