sábado, 28 de maio de 2011

Construtores de Pontes: os limiares de experiências na escola

O mundo entra na gente se estamos abertos para ele. Baseio-me em Nietzsche para compreender as expressões humanas, quando retira todos os recursos da linguagem para dizer o que ela recobre: o corpo, a realidade, as marcas do caminho. Estamos nus ou enuviados. A pulsão criativa reinventa a linguagem e as expressões. A criança, a nossa semente, acentua suas aprendizagens reinventando os modos de dizer. Ela constrói sua identidade se identificando ou se estranhando com o ambiente. A linguagem primeira do corpo é o gesto, após domínio inconsciente do próprio corpo, e a linguagem primeira da escrita é o desenho. Gesto e desenho se relacionam. O corpo é subutilizado ou é conceituado nas expressões humanas.

A construção do conhecimento e as influências constantes do meio marcam as relações aprendentes. As formas de observar a atuação e o desempenho facilitam e aperfeiçoam o modo de capturar, acompanhar e interpretar o processo longitudinal das aprendizagens. O processo educacional é construído através do estabelecimento de relações entre as pessoas aprendentes, mediatizadas pelo mundo.

A linguagem se traduz nos movimentos corporais, referências dos gestos, acenos, falares, dizeres e suas representações. A linguagem sinestésica é básica de compreensão e tece a trama viva das interrelações, muitas vezes invisíveis ao olhar hierárquico da cultura visual e auditiva. Os canais corporais de percepção tátil, olfativa, palatal são menos observáveis. Costumo exemplificar quando escrevo nas costas do colega com o dedo indicador uma letra qualquer ou uma forma geométrica e peço que ele reproduza no papel a mensagem recebida. A informação corresponde às percepções sentidas pelo toque. Como fomos ou somos tocados pelo(s) outro(s)? Memórias evocadas nos dizeres e suas interpretações recriam-se.

Essa forma de dizer/interpretar ajuda muito o surdocego a realizar sua leitura de mundo e nós a entender como se aprende a interagir e a ler o ambiente através do corpo. Somos muito mais visuais que auditivos. Mas sem a base corporal nada podemos comunicar. Por vezes sentimo-nos confusos diante de quem não enxerga ou não ouve. Algumas pessoas evitam se relacionar com cegos e surdos. Pior ainda com surdocegos. Além das sensoriais, outras sentem dificuldades de lidar com as deficiências mentais. E as psicológicas ou sociais?

Com o conhecimento, aos poucos pré-conceitos são derrubados. Múltiplas linguagens incorporam-se às experiências educativas. Este salto de dimensão consegue instituir relações complexas de reciprocidade e cooperação, desenvolvendo simultaneamente múltiplos canais de comunicação e interação humana. O olhar sobre o outro deve admitir a condição de também ser olhado pelo outro. As pessoas estão aí.

O corpo fala. O desenho revela. As palavras indicam. A linguagem se multiplica com a palavra impressa. As imagens ilustram sentimentos mais que a palavra escrita. As formas comunicacionais orientam dizeres através dos diferentes sentires e suas percepções. A escola privilegiou por um bom tempo somente a palavra escrita.

Depois que se aprendia a ler, o desenhar rareava. O prazer se restringia. Mente inquieta ou desocupada desenhava para não atrapalhar quem escrevia. Na escola, havia quem terminasse cedo para desenhar. Linguagem imagética desprivilegiada. Bonito, lindo, capriche mais, vistos que desencantam, esgotam o desenho.

Por que as pessoas preferem ler mais fotos, desenhos, filmes onde há mais figurinhas do que a palavra escrita? As palavras na net diminuem. Mini-blog ganha destaque. Menos palavras e maior poder de comunicação. Palavras-chaves.

Corpos ambientes. Leitura de mundo. Aprendizagem escolar. Combinam? A aprendizagem situada ganha destaque. É mais significativa às pessoas. Compõem o cotidiano da leitura de mundo. Mediar é saber religá-la às outras culturas. Evocar processos interativos.

A criança sente o papel. O papel é como se fosse sua pele. Por ali impressões táteis se configuram e se traduzem, os movimentos ganham formas e contornam ideias. A pressão do papel é algo fisiológico. Revela emoções. A raiva é energia pesada no papel, a pressão do lápis fere, fura o papel... O medo indica desproteção, movimentos tremidos, hesitantes, apagados, duplos... A timidez se recua num canto da folha. O lápis fere, desliza, sinaliza... Borracha oculta incertezas. Marcas a tatuar a pele ou a folha do desenho.

Gestos. Desenhos. Comunicação primeira. Imagens atraem. Somos visuais. As palavras sintetizam dizeres. Leituras e releituras. Fluências ou profusões. Interlocutores. Culturas. Hábitos. Significados. Concepções relacionam ou discriminam.

Educar as emoções. Educação moral. Ética relacional. Educação ambiental. Culturas entrelaçadas. Valores ressignificados. Formação ou punição. Integração ou segregação. Educação ou reeducação. Criatividade ou coerção. Pulsão ou repulsão. Expressões coibidas. Aplicação ou desvio. O contexto e o fim. Educação é fim. O social é relação, é meio que permeia e influencia. A influência é política. A mídia é relacional e política. Inteligências mobilizam cultura e sentimento, emoções comunicacionais, estilos e tendências.


A professora ou o professor aprende a se relacionar com as aprendizagens e o não-aprender na práxis escolar. A vida na escola vai nos tornando cada vez mais humanos. O locus das aprendizagens valorizam o ensino. Os pássaros ensinantes são capazes de construir em comum um locus de aprendizagem capaz de tornar os aprendizes pássaros sábios e felizes. Diante da violência que se estampa nas escolas e nas intertelas da comunicação integrada redesenhamos juntos os pássaros da paz.

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