segunda-feira, 28 de junho de 2010

Um jeito ecológico de ser: nossos estudos e interdependências


Para a vida comum e em comum, os saberes e invenções cotidianas facilitadas ou reeditadas nas relações professor-aluno-alunos enredam e se redesenham na pluralidade de fazeres-saberes e acenam possibilidades de intervenção, outras experiências e criação possíveis, trago o pensamento de Kupfer (2001) para nos fazer re-olhar as atitudes pedagógicas contingentes aos ambientes pedagógicos da escola ou em suas versões ampliadas na comunidade circunvizinha, ribeirinha, presencial ou virtual.
Ao professor, guiado por seu desejo, cabe o esforço imenso de organizar, articular, tornar lógico seu campo de conhecimento e transmiti-lo a seus alunos. A cada aluno cabe desarticular, retalhar, ingerir e digerir aqueles elementos transmitidos pelo professor, que se engancham em seu desejo, que fazem sentido para ele, e que, pela via de transmissão única e aberta entre ele e o professor, encontram eco nas profundezas de sua existência. Se um professor souber aceitar essa “canibalização” feita sobre ele e seu saber (sem, contudo, renunciar as próprias certezas, já que é nelas que se encontra seu desejo), então estará contribuindo para uma relação de aprendizagem autêntica. Pela via da transferência, o aluno “passará” por ele, usá-lo-á, por assim dizer, saindo dali com um saber do qual tomou verdadeiramente posse e constituirá a base e o fundamento para futuros saberes e conhecimentos. (Kupfer, 2001, p.99-100)
Assim, preocupada com a dinâmica das aprendências, reconhecendo os papéis de seus protagonistas e fomentando a formação de novas identidades culturais que caracterizam o sujeito ecológico, reapresento sugestões de leituras no sentido de contribuir com o desenvolvimento de projetos pedagógicos voltados aos princípios norteadores da educação ambiental buscando relações mais harmoniosas com o seu meio e o lugar das novas aprendizagens vivenciadas a partir do interior das conversações entre ensinantes e aprendentes.

As sugestões on line pontuadas a um professor que está desenvolvendo projeto pedagógico sobre o lixo com a sua instigante pergunta "de quem é o problema?" - como desafio ao 5º ano, de uma unidade pedagógica ribeirinha situada na Ilha de Cotijuba, para repensar mediações pedagógicas, pois, em sua turma estão incluídos repetentes e outros com defasagem idade-escolaridade, por isso mesmo, as aprendizagens e as não-aprendizagens precisam ser observadas de forma a ressignificar seus conhecimentos e leituras de mundo ampliando o território de crianças e pré-adolescentes ali situados e a partir do seu lugar de vida, com esperança na mudança e na possibilidade de construírem um mundo melhor que alimente um permanente diálogo e compromisso com a vida.


O gesto de cada criança pode fazer a diferença nesse movimento, e por isso adotei a campanha do swu, pois, tudo pode começar com você, comigo, com ela... Assista ao vídeo da campanha:



Nessa pauta que se abre, e à espera de outras mais, listam-se as respectivas referências, links e esperanças:


- Água on line: http://www.aguaonline.com.br/ (revista informativa sobre água, saneamento e meio ambiente, com notícias, informações, textos, publicações e ligações com outras entidades ambientais).
- Amazônia:
http://www.amazonia.org.br/ (site informativo do projeto de análise e monitoramento da Amazônia realizado pela ONG Amigos da Terra. Traz notícias sobre a Amazônia, cobrindo os temas de economia, população, instituições, políticas públicas, legislação, áreas de conservação, desflorestamento, desenvolvimento sustentável, mineração, manejo, biodiversidade e recursos naturais, além de indicar outros sites ligados ao estudo da Amazônia. Informa sobre projetos de EA desenvolvidos na região).
- 5 elementos:
http://www.5elementos.org.br (Instituto & Pesquisa Ambiental – reciclagem de pet). Visa desenvolver metodologias e multiplicar ações por meio de EA. Desenvolve programas em parques urbanos mediante trilhas monitoradas, programas em escolas com a temática de consumo, lixo e coleta seletiva, capacitação de educadores e seminários.
- Conama:
http://www.mma.gov.br/conama/ (o site tem a finalidade de informar sobre a política ambiental brasileira e subsidiar a tomada de decisão nessa área).
- Lixo: http://www.lixo.com.br/ (página informativa sobre resíduos sólidos, coleta seletiva, destinação, reciclagem e lista de cooperativas de coleta de vários Estados da Federação).
- Meu planeta, minha casa: http://www.meuplanetaminhacasa.com.br/ (site voltado para crianças até 13 anos e professores. O objetivo é de conscientizar, alertar e dar dicas de como cada um pode ajudar a proteger o planeta com ações simples e práticas no dia a dia).
- Reciclar para construir:
http://www.reciclagem.pcc.usp.br/ (site com informações de resíduos, tais como materiais de construção civil. Nele estão reunidas fontes bibliográficas – artigos de periódicos, artigos em congressos, teses, relatórios de pesquisas, endereços na internet, nomes, endereços de pesquisadores).
- Recicloteca:
http://www.recicloteca.org.br (é um Centro de Informações sobre Reciclagem e Meio Ambiente criado pela ONG Ecomarapendi e patrocinado pela AmBev. O site oferece informações sobre as questões ambientais, com ênfase na redução, no reaproveitamento e na reciclagem do lixo).
- Revista Ambiente:
http://www.revista-ambiente.com.ar/ (revista eletrônica argentina da Fundação CEPA, com projetos destinados à melhoria de condições de vida e articulações do homem com a natureza; traz artigos, opiniões e informações sobre a fundação)).
- WWF - Fundo mundial para a natureza:
http://www.wwf.org.br/ (traz informações a respeito de espécies em perigo, biodiversidade, camada de ozônio, desenvolvimento sustentável, efeito estufa, além de outros temas ambientais. Por meio de solicitação virtual, é possível adquirir exemplares das publicações dessa organização. O site também apresenta o relato dos projetos de conservação e desenvolvimento implementados pelo WWF e seus parceiros pelo país).

Sugestões bibliográficas:
- CARVALHO, Isabel Cristina de Moura. Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2008.
- CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano I: as artes do fazer. Petrópolis/RJ: Vozes, 1994.
- GUIMARÃES, Sandra Kirchner; STOLTZ, Tania (Org.). Tomada de consciência e conhecimento metacognitivo. Curitiba: Ed.UFPR, 2008. (O conhecimento metacognitivo de crianças em processo de alfabetização e suas implicações para o aprendizado da linguagem escrita – p.29-55; Aprendizagem baseada em problemas, metacognição e tomada de consciência: reflexões sobre um estudo transversal – p.153-175; A percepção e a tomada de consciência do meio ambiente: contribuições ao desenvolvimento da educação ambiental – p.279-305).
- KUPFER, Maria Cristina Machado. Freud e a educação: o mestre do impossível. 3 ed. São Paulo, Scipione, 2001.
- MORIN, Edgar. Aprendizagens culturais cotidianas, cidadania e educação. In: OLIVEIRA, Inês Barbosa; SGARBI, Paulo. Redes culturais, diversidade e educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. (p. 37-56).
- PORTILHO, Fátima. Sustentabilidade ambiental, consumo e cidadania. São Paulo: Cortez, 2005.
Imagem 1: Unidade Pedagógica de Jutuba II, cedida pelo professor Roberto Senna (arquivo pessoal).

quinta-feira, 24 de junho de 2010

No mundo da Lua: aprendizagem e vida longa aos planos de assistência e saúde


Persigam o que imaginam ser impossível, sonhem em grande, e façam com que o “impossível”, aconteça! (Eugene Cernan, 2009, último homem a caminhar no solo lunar)
A Lua não está vestida com uma superfície suave e polida, é áspera e desigual em todas as partes, caminhar por ela nos parece quase impossível, os astronautas pulavam, saltitavam, escorregavam, caíam, reerguiam-se. Lá no espaço, totalmente desprotegida de atmosfera, caem sobre ela meteoros e em velocidade desigual, as diferentes crateras em sua superfície vão se "conformando e recompondo-se" entre outras. Ela é o nosso escudo!
Assim no acaso, totalmente à revelia, me senti ao subir no disco de propriocepção. Mas, também ali, naquele cai não cai, até me sustentar em pleno ar sozinha, rindo de mim mesma, vi-me em plena produção contínua pela vida, movimentando meu metabolismo e conhecendo que também ali produzia a essência de algo fundamental para a vida. Fiz a releitura da “autopoiese” de Maturana, palavra combinada em pleno olhar entre o caminho das armas (o agir, o fazer) de Don Quixote e de sua literatura (a poiese, o pensar), no vôo da vida e pela ventura de viver. Segundo Maturana (2005), sem o comportamento autopoiético, os seres orgânicos não se sustentariam, não permaneceriam vivos! E nós ainda dizemos que não sabemos voar. E o que é ser bípede?! Só ali senti, naquele balançar-se, e pensei cheia de metáfora e vida...

E me volta Cernan, o último astronauta a andar na Lua, a me fazer refletir mais um pouco dessa nossa constituição, revisitando conhecimentos no processo de reeducação do movimento humano, pois, segundo ele, “a curiosidade é a essência da existência humana e a exploração do desconhecido sempre fez parte daquilo que significa ser humano”. E perguntas continuam surgindo nesse exercício de treinar equilíbrio e me reconstruir no vai e vem:

Como o ser humano aprende a ficar em pé? Como ele aprende a sentar e a levantar? O que nos constitui? O que nos torna autônomos?
Pois é! Essas são algumas das reflexões que venho me fazendo a cada sessão de fisioterapia. Deixar de usar as muletas cor-de-rosa, que o fisioterapeuta chamou carinhosamente de "patricinhas", é a perspectiva do momento. Como elas são úteis no meio de outras pessoas, após a cirurgia nos dois joelhos, ali na clínica vivemos nos esbarrando, eu com medo de cair, machucar mais os joelhos e incomodar os outros. Nesse estado os meus novos aprendizados a respeito da dor e superação.

Porém, se não bastasse os próprios limites e a angústia de trabalhar, estou enfrentando um pequeno grande obstáculo. Fui obrigada a interromper o tratamento fisioterápico ontem. Por quê? Na terça-feira, meu esposo foi ao Instituto de Previdência e Assistência do Município de Belém, para entregar a solicitação do médico para eu fazer mais dez sessões de fisioterapia e para surpresa nossa, não mais poderia continuar o tratamento na clínica onde estava. Cada beneficiário só tem direito a 30 sessões anuais de fisioterapia. Fiz vinte sessões antes da cirurgia e depois da cirurgia só estas dez. O médico indicou quarenta, dez por requisição, como parte do tratamento.

Teria eu que financiar as demais sessões. Meu esposo foi conversar com a assistente social para que estudassem o caso, indicaram a fisioterapia no próprio Instituto, fiquei receosa, porque sempre fiz fora e por indicação do próprio instituto, não é para ficar? Por que agora eu posso fazer por lá? Talvez por ser atendimento restrito e melhor ainda, porque não pagarei pelo serviço.

Preocupação dois: haverá estrutura, condições de acessibilidade e recursos para o meu caso? E a agenda será de atendimento diário como na clínica externa?

Serei atendida somente no dia primeiro de julho, ou seja, daqui a sete dias, isto porque é pós-operatório por lesão no menisco medial e ter condromalácia patelar congênita – ou seja, não adquirida!

- E os planos de saúde não mudaram?

Das aprendizagens básicas a me fazer pensar nos movimentos do corpo humano, valorizar ainda mais os profissionais da saúde e da educação motora, médicos, enfermeiros e fisioterapeutas, ou seja, aqueles que nesta etapa me lembram os professores de educação física. Antes da cirurgia, como parte do tratamento de um ano e meio, freqüentei hidroginástica e programação muscular específica em academias.

Ontem fiquei frustrada pela dor que sentia, ora fui privada de me sentir na lua, em cima de uma almofada de propriocepção (controle neuromuscular), no começo sentia medo de cair, mas, a presença do fisioterapeuta me assegurava a entender o que é ficar de pé, parecia uma “joana-boba” (rsrsrs!). Subir nesse disco ajuda a nos manter em pé, na reabilitação e fortalecimento de tornozelo, joelho, quadril e lombar, dando ênfase ao treino de equilíbrio, postura e coordenação motora. A cada movimento a advertência: "olha a elegância!". E eu ali a lembrar: "olha a dor". Diminuimos o tempo e aumentamos a pausa.


Às vezes, o tratamento nos angustia, pois a dor, muitas vezes impede de prosseguir com as atividades físicas. Comecei a sentar e a levantar, apareceram pequenos hematomas, mudou-se o tratamento para levantar pernas com pequeno peso, não deu e assim fomos chegando aos movimentos mais básicos para o meu caso. Passaram-se as dez sessões e agora que estávamos encontrando o caminho, fomos interrompidos pelo problema do plano de saúde.

Paciência de professor, de funcionário público na cidadania brasileira. E o corpo deverá esperar mais sete dias.
Voltei a falar do que meu coração está cheio... São as novas alfabetizações, novas aprendências. Disse eu ao Max, amigo virtual, lá de Bagé, da nossa região Sul, que estou eu bem - e aos demais que me escrevem, ligam ou deixam recados na rede virtual de blogs ou e-mail, estou entre armas e literatura (coisas de Quixote). Porém, deixei a clínica com a programação interrompida e cuidadosamente acompanhada e fico à disposição do instituto daqui. [snif! snif!]. Por ser algo reservado penso que deva ser melhor, afinal, são poucos aqueles que conseguem fazer as sessões de fisioterapia no próprio Instituto.

As esperanças continuam. Somos educadores! E assim aprendemos a educar-a-dor.



Para saber mais a respeito de Maturana e da compreensão humana:
MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. 5 ed. São Paulo: Palas Athena, 2005.

Imagem 1: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Moon-craters.jpg
Imagem 2: http://www.fisiostore.com.br/product.aspx?idproduct=PFOX-DISPP
Imagem 3: http://www.sistemaodia.com/noticias/por-que-as-pessoas-gritam/fotos-10533-0.html

quarta-feira, 16 de junho de 2010

A consciência ambiental e a aventura poética das crianças de cinco a seis anos


Como podemos contribuir com o processo de formação da consciência ambiental de crianças da educação infantil? Quais referências contribuem com o saber pensar e norteiam a importante pedagogia que acompanha o fazer cotidiano e o desenvolvimento da criança de cinco a seis anos?

As bases que sustentam o Referencial Curricular Nacional para a Educação infantil (RCNEI) definem e rediscutem a práxis no sentido de saber explorar o meio ambiente como forma de possibilitar as aprendizagens das crianças. Nessa perspectiva, despontam ações que levam os alunos a interagir com o seu meio e realidades como alternativas para perceber a própria constituição enquanto um dos indivíduos, natural e saudável, entre diferentes naturezas, sobretudo, capaz de manejar saberes, de cuidar, preservar, valorizar, poetizar, transpor, sonhar, conhecer mais o lugar que compõe a sua dimensão identitária e fortalece o sentido de pertencimento planetário.

Educar significa defender vidas, segundo Assmann (2007). Que atividades denotam a práxis integradora dos alunos, capaz de religar processos vitais e cognitivos em seus pequenos grandes gestos que, através da dinâmica do vivo, ou seja, dinâmicas que unem a vida e o conhecimento, contribuem com a formação da consciência ambiental da criança e, por conseguinte, favorecem o movimento pela qualidade de vida planetária?

Gaarder (2005) aproxima-nos mais desse pensar articulado entre o vivido, o percebido e o concebido relacionando o que vivemos ao que somos a partir de nossas atitudes, capaz de evocar também o sentido de religação com a nossa história humana, pois, para ele "o futuro não é algo que simplesmente acontece por si mesmo. Estamos criando o amanhã neste momento. Hoje em dia muitas pessoas sentem-se como meros espectadores dos fatos globais. Mas, devemos aprender que todos nós somos atores e que estamos modelando nosso futuro agora mesmo".

Como as crianças percebem essa relação com o hoje, a sua corporeidade viva, as ações aprendidas na escola, e ajudam-nas a re-olhar o cotidiano de suas relações com a vida e, principalmente, cooperam com o repensar docente sobre as implicações necessárias, as circunstâncias adversas e as possibilidades de tornar o mundo melhor e mais bonito?

É preciso considerar os saberes construídos pelas crianças antes da chegada na escola e também pensar acerca de possíveis privações, lacunas, faltas ou desejos acalentados em seu meio. Conhecer o perfil sócio-antropológico do alunado e, principalmente, dos que formam uma classe escolar, enquanto amostra de unidade educacional, leva o professor-pesquisador trabalhar de forma integrada e interdisciplinar, incluindo outros colegas que estejam atuando na mesma turma. A pedagogia de projetos fortalece esse vínculo a favor da criança concreta e constitui esse pensar integrado e de não somente pensar o trabalho pela ou para a criança, mas inclui-la dialogando com ela a complexidade de suas relações com outras crianças, adultos, saberes e conhecimentos.

Sobre crianças, suas concepções e possibilidades de se articular com o mundo, Alves (1999) nos ajuda a repensar pois "há crianças que nunca viram uma galinha de verdade, nunca sentiram o cheiro de um pinheiro, nunca ouviram o canto do pintassilgo e não tem prazer em brincar com a terra. Pensam que terra é sujeira. Não sabem que terra é vida". Assim como há estágios do desenvolvimento intelectual que as crianças não dão conta de perceber que uma pedra pode ser um indivíduo originariamente metafórico, poético, ou que a árvore, a flor, a folhagem são seres vivos e necessitam de respeito e cuidados, e que mantemos relações de interdependência com o meio, e por isso mesmo são vitais à preservação de nossa espécie.

Qual é a textura e a temperatura da terra no plantio? A terra é sujeira? A aprendizagem é um processo corporal, acompanhada de sensação de prazer. Segundo Assmann (2007, p.29), “quando esta dimensão [prazerosa] está ausente, a aprendizagem vira mera instrução”. Como desconstruir mitos ou crenças que inviabilizam novas formas de aprender?

A criança é emoção e sua forma inicial de pensar é a partir do que forma, provoca e regula o seu sentir e assim vive e se renova na reserva do lar, arquétipos que se relacionam com a vida. As emoções se desdobram através de sensações, afetos e sentimentos enredados. Boff (2008), corrobora nesse pensar ao afirmar que "tudo começa com o sentimento. É o sentimento que nos faz sensíveis ao que está à nossa volta [capaz de nos fazer gostar ou desgostar, escolher ou preterir]. É o sentimento que nos une às coisas e nos envolve com as pessoas. É o sentimento que produz encantamento face à grandeza dos céus, suscita veneração diante da complexidade da Mãe-Terra e alimenta enternecimento face à fragilidade de um recém-nascido. Esse sentimento profundo se chama cuidado. Somente aquilo que passou por uma emoção, que evocou um sentimento e provocou cuidado em nós, deixa marcas indeléveis e permanece definitivamente". Sentimento que germina nossa forma de pensar o mundo e nos principia na capacidade de nos tornar sujeitos reflexivos, em nossa própria e típica forma de pensar as relações cotidianas, que por sua vez nos autorizam ou desautorizam a ser co-autores de pensamentos.

Uma característica marcante nas crianças mais novas é o forte vínculo que elas tem com seus familiares. Nessa primeira fase da escolaridade, a escola dinamiza ainda mais a função integradora com a família. As crianças por serem naturalmente curiosas, descobridoras e trazerem consigo toda uma pré-história construída em suas vivências e grande parte através da atividade lúdica, buscam ativamente o conhecimento e para elas brincar é mais importante que as falas, a ação mental, o pensar. É nas brincadeiras que ativam memórias, processam o novo, aprendem a conhecer a si próprias, o outro, seus fazeres, seus dizeres e o mundo que lhes cerca. Durante a escolarização, haverá momentos de ação, de chamadas de atenção e atenção voluntárias, mas o mais importante é que todas as situações de ensino sejam interessantes para a criança, que favoreçam suas competências e potencializem suas inteligências e habilidades. Nessa fase da escolaridade priorizam-se as vivências em que a criança amplia seus conhecimentos através da busca e da descoberta, de forma prazerosa, aprendendo a ser confiante e a participar de atividades em grupo.

Como problema pedagógico da escola, os conteúdos devem ter significado para o alunado, além de selecionados e redefinidos os critérios pelos educadores e a comunidade a partir das discussões abertas acerca do que traz o RCNEI em suas determinações, a exemplo revisitando o capítulo sobre "Natureza e Sociedade", que recomenda e se preocupa em utilizar os conteúdos organizados e definidos em função das diferentes realidades e necessidades, de forma que possam ser de fato, significativos para as crianças. Os conteúdos se relacionam em função dos seguintes critérios: relevância social e vínculo com as práticas sociais significativas; grau de significado para a criança; possibilidade que oferecem de construção de uma visão de mundo integrada e relacional; possibilidade de ampliação do repertório de conhecimentos a respeito do mundo social e natural. Se trabalhado com a criança na forma de projetos, a integrar as diferentes dimensões do mundo social e natural, em função da diversidade de escolhas, aumentam-se as possibilidades interdisciplinares dentro desse eixo de trabalho.

As crianças não raciocinam como os adultos. As crianças são as próprias construtoras ativas do conhecimento, constantemente criando e testando suas teorias sobre o mundo. Nos jogos e brincadeiras infantis, aparecem as noções de regras, a socialização se faz presente, o simbólico é exercitado, além do físico e o mental. Mas, os adultos podem aprender a ouvir as crianças desde que dispostos a conversar e a admirar-se da capacidade delas pensar e religar o universo das coisas que assistem em seu meio.

As crianças descobrem por si mesmas que se pensa com a cabeça? Para ouvi-las podemos perguntar a elas: “quando a gente anda, anda com os pés. Quando a gente pensa, pensa com o quê?” O que iremos ouvir delas?

Dentre os estudos piagetianos, há amostras de conversas de um adulto com uma criança de 5,9 anos e a outra conversa, também característica do realismo infantil (fabulação), com uma de 6 anos, sobre memória, sobretudo porque esta havia espontaneamente falado a palavra e gerado curiosidade acerca de sua concepção.

“Quando você pensa, com que você pensa?” Não sei. – Com as mãos? – Não. – Com a cabeça? – Não. Nunca vemos a cabeça pensar. – Com que você lê? – Com os olhos. – Você pode pensar de olhos fechados? – Sim. – E com a boca fechada? – Não posso. – Com os ouvidos tapados pode? – Sim. – Os bebês pensam? – Não. Eles não sabem. São muito pequenos. – Com que se pensa? Não sei. Nunca vi o pensamento. – Pensamos com a cabeça? Não. – Com quê? – Com a boca”. (Piaget, 2005, p.40).
“O que é a memória? – É quando a gente se lembra de alguma coisa. – Como a gente se lembra? – Ela volta de repente a nossa alma. Primeiro alguém nos diz alguma coisa, e isso vem a nossa alma, depois sai e volta. – Sai? Vai para onde? – Para o céu. – Você acredita nisso? – Sim, não sei, mas disse o que sei (o que acredito ser)”. (Piaget, 2005, p.43).

A maioria das crianças desse período, segundo Piaget (2005), pensa que pensamos com a boca, os ouvidos ou uma pequena voz. Uma dessas crianças pesquisadas se referiu a “pensar com o coração”, mas, no percurso percebeu-se que foi uma palavra aprendida, pois, logo em seguida mudou de idéia e disse que pensava com os ouvidos.

As crianças tomam consciência do mundo de diferentes maneiras em cada faixa etária. As transformações do seu pensamento ocorrem simultaneamente com o desenvolvimento da linguagem na multiplicidade dos dizeres e em suas diversas formas de expressão. Como curiosas e não meras espectadoras diante de fenômenos, fatos e objetos do mundo, vão perguntando, reunindo informações, organizando explicações, arriscando respostas e modelando seu modo de conceber a natureza e a cultura. Neste contato com o mundo, confrontam seu pensar com as diversas formas de dizer de adultos, outras crianças, interação com os meios de comunicação e fontes de referências como livros, notícias, mídia aberta ou fechada, por meio ainda de atividades físicas, afetivas e mentais, construindo assim explicações subjetivas e individuais para os diferentes fenômenos e acontecimentos.

Algumas ações pedagógicas chegam lá, desde que antes de se propor algo às crianças se escute o que elas entendem sobre o assunto e quais saberes estão implicados nos discursos. Falar sobre a natureza em volta, suas curiosidades, fragilidades ou contrariedades, discutir o cenário, as cenas percebidas ou imaginadas, na escola ou em aulas-passeios pela comunidade, lugares típicos ou críticos fora do bairro e que possam rediscutir preservação ou sustentabilidade.

Qual o conhecimento inicial da turma? Sobre a formação da consciência ambiental de crianças da Educação Infantil é importante abordar temas e conteúdos que produzam resultados ao alcance delas. Um dos projetos da escola que produzem este efeito é o cultivo da horta do conhecimento, cujas palavras-mundo também são escritas no chão da horta pelos alunos, como jogo lúdico e leitura de mundo, o entrelugar da sala até a horta faz redescobrir o espaço e os elementos que compõem esse território, borboletas azuis, formigas, cantos dos pássaros, laguinho da escola, peixes, plantas aquáticas, presença de outros insetos, aspectos da paisagem e da sazonalidade climática, folhas caídas e típicas, folhas novas despontando, parasitas nas árvores, músicas cantaroladas, conversas animadas, a técnica do plantio e cuidados observados e vivenciados, a colheita e a festa que celebra esse momento de culminância e fertilidade compartilhado com as mães ou pais que ajudam a ressignificar os produtos da horta, a reorganizar o ambiente, o cuidado com o desperdício, o descarte e a higienização, o gosto de saborear sucos verdes e naturais, propor receitas alternativas, enriquecer o cachorro-quente tão esperado pelas crianças, a ouvir e entoar cantos, a sorrir mais nas representações pedagógicas que redesenham todo o processo vivenciado pela turma.

O que muda? A forma de encarar a produção de alimentos naturais, o costume de se alimentar na escola, o cardápio e os hábitos alimentares da família, a disposição em aprender, a forma de pensar o processo e a oportunidade de conviver com outras pessoas, a articulação entre teoria e prática.

O ambiente escolar deve comunicar e adaptar os avanços científicos e tecnológicos considerando a interpretação da criança, a consciência ambiental despertada, a convivência, a espiritualidade e a solidariedade a partir de relações múltiplas, complexas e integradoras que o alunado estabelece no cotidiano de suas aprendizagens escolares que potencializam a sensibilidade social, as competências solidárias e tarefas sociais emancipatórias como metas vitalizadoras do tecido social.

Procurei avaliar a pedagogia da escola, viagens e pousos na blogosfera acerca das possibilidades pedagógicas e gostaria da contribuição de colegas acerca dessa aventura de tornar nosso mundo melhor a partir das ações pensadas por crianças da educação infantil de quatro a seis anos. Que experiências vocês acumulam? Quais sinais desse processo consciente da natureza infantil atrelado aos novos modos de ser criança e de estar-sendo-no-mundo-com-os-outros e que vão se misturando à aventura poética e singular do modo de estar no mundo dessas crianças em seus lugares e que nos ajudam a re-olhar as nossas próprias aprendências?

Reencantei-me com a forma como as crianças aprendem em classe unidocente e escrevem poeticamente sobre suas relações com o meio e as aprendizagens vivificadoras situadas no município de Baixo Guandu (ES). Chegue até lá e vibre com as postagens que nos ajudam a acreditar na educação libertadora. O blog da Lenira e de suas colegas é o da “Alfabetização em foco”. Vale a pena conferir, clique aqui.

Toda criança é capaz de aprender, a desestruturar as nossas certezas e nos tornar co-aprendentes de seus saberes através de nossa ação mediadora de professores-pesquisadores reencantados com o próprio fazer, é preciso repensar uma nova pedagogia do aprender e ensinar, que incentiva o uso de diferentes formas de representação e de comunicação do pensamento e de novas relações com o conhecimento, que envolve o reconhecimento da necessidade de prever situações didáticas contextualizadas na realidade do aprendente. E implica repensar estratégias didáticas reconstrutivas do conhecimento.

Referências
- ALVES, Rubem. O amor que acende a lua. Campinas, SP: Papirus: Speculum, 1999.
- ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: rumo à sociedade aprendente. 9 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
- BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano, compaixão pela terra. 15 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. - GAARDER, Jostein. Uma ética ambiental para o futuro. Revista Eco 21. Ano XV, n.98, jan. 2005. (Gaarder escreveu este artigo para o livro “A paz é possível”, que o Escritório Internacional para a Paz - International Peace Bureau, dedicou à Conferência Mundial para a Paz, de Haia, 2004).
- GUIMARÃES, Sandra Kirchner; STOLTZ, Tania (Org.). Tomada de consciência e conhecimento metacognitivo. Curitiba: Ed.UFPR, 2008. (O conhecimento metacognitivo de crianças em processo de alfabetização e suas implicações para o aprendizado da linguagem escrita – p.29-55; Aprendizagem baseada em problemas, metacognição e tomada de consciência: reflexões sobre um estudo transversal – p.153-175; A percepção e a tomada de consciência do meio ambiente: contribuições ao desenvolvimento da educação ambiental – p.279-305).
- PIAGET, Jean; INHELDER, Bärbel. A psicologia da criança. 2 ed. Rio de Janeiro: Difel, 2006.
- _____. A representação do mundo na criança. Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2005.

Imagem 1: http://img123.imageshack.us/i/folhamundoda5.jpg/
Imagem 2: http://terradatati.blogspot.com/2009/06/necessidade-organica-do-bebe-ou-nao.html

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Blog: na tela o que o teclar pulsa


O que mais admiro é a capacidade humana de escrever sobre o que quer dizer, o que precisa dizer, o que sabe dizer, o que gostaria de escutar, o que tem a comunicar e procura corresponder ou o que deseja de retorno, é a sua capacidade primeira de se colocar no lugar do outro, de quem busca a interlocução, de quem pretende tocar, cativar, ser amigo... sobretudo, porque “o ser humano consciente não está preocupado em combater o mundo que há, mas em criar o mundo que poderia ser” (El Morya).

Assim ao seguir nas infovias blogarianas e chegar nos endereços amigos a gente vai lendo o que cada um tem a dizer, nos dar a conhecer e nos possibilitar questionar, assentir, refletir, silenciar ou contra-argumentar. Diferentes identidades, estilos e dizeres múltiplos perfazem essa troca maravilhosa entre blogueiros. Cada um escolhe o que tem a ver com o que busca encontrar ou se surpreender. Novidades e pesquisas. Emoções e sentimentos. Valores pertinentes.


O que hoje escrevo não foge à regra dessas entrelinhas expostas, é sobre o que está cheio o meu coração (ver Lucas 6:45). Estou me recuperando da cirurgia dos joelhos, só posso andar em linha reta, dormir e sentar sem dobrar um milímetro das articulações afetadas. Igual a um robozinho. Preciso da ajuda da família nas necessidades mais básicas. E este é um novo (re)aprendizado, o de ser guiado pelo outro e voltar a ser dependente. “É a vida, é bonita e é bonita [lembrando ainda que] somos nós que fazemos a vida como der, ou quiser ou puder” (Gonzaguinha). Humor melhorado.

Estou de volta, com uma nova etapa a enfrentar. A recuperação. E assim sem medo de ser feliz submeto-me às novas aprendências. Coube-me um trecho de Vera Godoy e que aqui transcrevo: “Cabe às pessoas lúcidas e de bom senso, não dar oportunidade para que o veneno da maledicência se alastre. Nenhum passo tem importância vital como o de colocar perante a humanidade o Conhecimento Superior, Sua Fonte de Vida e seu Poder Transcendente”. Por ele encerro esta etapa de transição. Àqueles que acreditam nessa instância que percorro e aos que se conformam com a realidade a trilhar... “As coisas podem ser diferentes do jeito que a gente pensa” (Jandira Masur). Da pedra brotam flores? Com fé se move montanhas. E dá-lhe sabedorias. Amém!

Imagem 1: http://ricbrsp.blogspot.com/2009/10/respirando-e-vivendo-uma-vida-virtual.html
Imagem 2: http://www.overmundo.com.br/uploads/banco/multiplas/1244011384_virtualzk3.jpg