sábado, 17 de julho de 2010

O filho que eu queria ter

Mês de julho, mês de férias, mês de histórias e releituras...

Se me perguntassem o que eu deixei de realizar nesta vida, diria o sonho a que me conduziu Janet Miriam Holland Taylor Caldwell (1900-1985), escritora britânica, em suas linhas viajantes, de luta, curas e amor pelo deus desconhecido, de “O médico de homens e de almas” (Dear and Glorius Physycian). Obra que é fruto de uma pesquisa de quarenta e seis anos sobre a vida de Lucano, ou, simplesmente Lucas, o único apóstolo não judeu, jamais chegou a ver Cristo e teve muito em comum com Paulo, acreditava que Jesus viera não apenas para os judeus, mas, também para os gentios. Admirei-me pelo tempo em que Caldwell, antes mesmo de seus doze anos de idade, dedicou-se aos estudos, leituras e entrevistas, em busca de tornar a história mais fidedigna, e como ela, passei a amar e a querer saber mais de São Lucas muito jovem.

A história de Lucano, bem diferente de Tomé, sem precisar ver para crer, é a da peregrinação de todos os homens através do desespero e das trevas da vida, do sofrimento e angústia, da amargura e tristeza, da dúvida e do cinismo, da rebelião e desesperança até os pés e a compreensão de Deus. Entrevistou Maria e antes mesmo tudo vinha mudando. Ouvia, sentia e a tudo escrevia.
Adoro ler a passagem quando Lucano com a Mãe de Jesus, em sua casa, registra passagens do nascimento, do bercinho feito por José, das “uvas grandes e redondas, ambarinas, com riscos vermelhos e roxos, reluzentes como pedras preciosas, de suco tépido e doce”, capaz de acalmar a sede e lhe dar mais vida, dos móveis da casa feitos por quem criou as galáxias, as constelações e os sóis, mas, soube aplainar as madeiras para que a cama e a mesa brilhassem como a seda. E com tanto orgulho como criou as Plêiades... Mas, o mais espetacular é ler os relatos de Maria sobre o bebê, o menino, o jovem e o homem que Ele foi nos momentos que esteve na Terra, e a lhe serenar com os olhos, mesmo em meio a maior tempestade advinda dos emaranhados humanos da turba. Era-lhe um menino forte, vigoroso, mas muitas vezes silencioso, que de súbito ficava imóvel no meio de seus brinquedos...

Uma das passagens emocionantes e fortes é quando Ela seguiu Jesus, aos quatorze anos de idade, e não sabia o motivo. Ele vestia uma roupa branca que ela mesma fiara e costurara. Logo, Ele parou feito uma estátua contra uma paisagem fulgurante. Não se movia e esperava. Cena de respeitoso temor: surge flamejante fogo fosco. Em seguida, não mais estava sozinho.


“Um grande anjo escuro, alto e majestoso, estava diante Dele, e eu senti que aquele anjo era só maldade, embora tivesse um rosto sombriamente belo (...) ele e meu Filho contemplavam-se mutuamente, em silêncio, e meu coração estremeceu de terror, ao vê-los assim se defrontando. Falaram? Não sei. (...) Meu Filho era muito jovem, mas alto e ereto, e não mostrava receio diante do terrível anjo de rosto belo, que era sarcástico e cheio de orgulho”. (Caldwell, 2004, p.667).

Segue-se aí, e por todo o livro, a narração amena, instrutiva e cheia de ternura. Inscreve-se interessantes episódios da história da humanidade antiga quando os césares eram imperadores e senhores do mundo, com importantes passagens sobre a mitologia greco-romana. Lucano dedicou estudo bem além das coisas visíveis, terrenas e humanas, ressaltou também diferenças profundas entre a aristocracia dominante e os marginalizados, pelos quais se condoia e se solidarizava.

Diante das distorções sociais, Lucano não compreendia porque o Deus desconhecido permitia a pobreza entre os homens, as doenças e os sofrimentos e por isso passou a perseguir Deus e a Morte. Queria salvar todos da morte e assim acreditava estar lutando contra Deus. Suas intervenções pareciam milagres, curou leprosos e outros males pela medicina, eliminou a peste de um galeão até Roma, com vocação profunda na recuperação da saúde, acreditava estar agindo contra o “deus desconhecido” dos judeus, gregos ou romanos: o único que era bom, justo e tão diferente dos outros deuses cheios de vícios, ódios e paixões. Pelo menos haviam lhe contado quando criança e eventualmente passou a desacreditar.

Conheceu Pôncio Pilatos, ouviu Tiago, João e Maria. Escreveu as mais fieis e belas páginas da crucifixão de Nosso Senhor ao lado de páginas dos outros evangelistas, sobre a cruzada 'gloriosa' de Cristo. Caldwell retrata as injustiças, a prepotência dos dominadores que fazem “a classe média ser esmagada até a morte sob taxas, extorsões e explorações que desde Roma, do império ainda vicejam”. O que isto tem a ver conosco na atualidade?

A leitura de “O médico de homens e de almas”, nos tonifica o espírito, é terapêutica! Independente de religião, como fruto de pesquisa, nos traz a lição de vida de São Lucas, apanágio da obstinação. Mostra-nos desde sua infância, amores e juventude, alegrias e frustrações, a decorrente e paradoxa perseguição contra Deus, e como para Saulo de Tarso, manifesta uma fé cheia de renúncia e dedicação.

Ganhei este livro de meu esposo, aos quatorze anos de idade, e assim prometemos, em 1977, que o nosso primeiro filho seria batizado por Lucas. Mas, o “destino” nos fez ter duas lindas meninas, Lorena e Lígia. Hoje com 29 e 26 anos. E eu continuo apaixonada pelo livro. Muitos outros se seguiram, destaco as histórias de Francisco de Assis, de José e Paulo de Tarso. Mas, continuo fascinada pela pesquisa de Taylor Caldwell. De tanto comentar e emprestar acabei ficando sem o livro, comprei outro em 2004, em uma nova encadernação.

Findo aqui com trechos do encontro de Lucas e Maria. Assim, homenageio a cor de fundo do meu blog, é a minha preferida.
Enquanto seu cavalo subia colina pedregosa, Lucano olhava para trás, para o mar, e pensava que só no Paraíso devia existir paz assim, vasta e azul tranqüilidade, tão envolvente calma. (...) Estou procurando Maria, a Mãe de Jesus, senhora (...) fiz uma longa viagem para falar com ela (...) viu pelo reflexo da luz, que era jovem e flexível, vestida com um tecido barato, azul-escuro, e usando véu branco. Enquanto ia subindo os degraus, o rosto levantou-se para o médico, e ele percebeu que a mulher era extremamente bela, de faces lisas e pálidas adelgaçando-se no queixo onde havia uma covinha. Tinha o nariz delicado, os lábios de um rosa suave e os olhos azuis mais encantadores que o médico já vira. Um caracol de cabelo dourado escapara de seu véu. Seu corpo e sua esbeltez eram os de uma jovenzinha, e seus pés, descalços, muito brancos. (...) Sou eu. Maria devia ter agora uns quarenta e oito anos (...) Contudo, olhando-a, ele percebeu que ela sofria uma sutil modificação, tornava-se mais velha, enchia-se de desgosto e tristeza, curvava-se um pouco. Então, de novo, estava misteriosamente jovem e ereta, calma como uma estátua, com a fronte lisa e branca”.Referências
CALDWELL, Taylor. Médico de homens e de almas: a história de São Lucas. 35 ed. Rio de Janeiro: Record, 2004.
Imagem 1: http://leonardosodre.blogspot.com/2010_03_01_archive.html

Imagem 2: http://portalveritas.blogspot.com/2009/01/evangelho-de-lucas.html
Imagem 3: http://www.sebodomessias.com.br/loja/imagens/produtos/produtos/281863_850.jpg

9 comentários:

  1. Oi, Maria

    Faz um tempinho que li este livro. É, realmente, muito bom, rico em detalhes sobre a época e os lugares. Pelo jeito, em relação aos governantes, nada mudou, infelizmente.
    O seu Lucas não veio mas como disse, vieram duas lindas meninas. Os nomes começarem com a letra L é alguma coincidência? rs

    Abraços e um ótimo fim de semana.

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  2. Pois é, Max!
    Pode acreditar, foi por pura coincidência. Eu fiz uma lista de nomes que mais gostava, Enéas escolheu Lorena. Eu queria nomes femininos brasileiros com sílabas bem simples. Por incrível que pareça, eu queria meninas, porque minha mãe só me deu irmãos e bem mais velhos que eu, e daí me sentia muito só. O nome da Lígia foi mais demorada a escolha, até que gostei do que li em um artigo e o nome da escritora era Ligia e me lembrei da Lygia Fagundes Telles, e preferi que fosse escrito sem o "y". Coisas de alfabetizadora. Eu queria Lia, pois, achava meigo, bonito e bem curtinho. Enéas não gostou. Mas, torcíamos para que fosse outra menina, mania de achar que Lorena se sentiria só como eu. E se por acaso viesse menino...

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  3. Como está tudo lindo e clean por aqui amiga! Fiquei com vontade de ler esse livro. Beijos,

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  4. Oi Adrianne!
    De vez em quando precisamos dar uma repaginada, não é mesmo? Outros beijinhos p'ra você também!

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  5. Rocio, muito obrigada pela dica. Já li Cícero da mesma autora e sempre tive curiosidade por este . Depois de sua resenha preciso ler este também. Obrigada pela dica.

    Bom domingo

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  6. Ei, Vanessa!
    Eu agora adorei a tua dica. Fiquei com vontade de ler Cícero. Boa troca!

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  7. Bela resenha, Maria! Também fiquei com vontade ler... (Oh, céus! Acho que nunca vou conseguir ler todos os livros que eu gostaria. A lista não para de crescer! rsrsrs)

    Tá uma belezura este lugar!

    Parabéns!

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  8. OI, Rocio. Cada vez é mais prazeroso visitar seu blog. Ah! Quanto ao selo que vc . me mandou, desculpe, mas acabei esquecendo de colocá-lo e agora não me lembro onde pegar. Me informe novamente, OK? Abraços amazônicos do Franz

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  9. Oi Franz,
    Que boa visita! Aceitou o desafio?
    O "selinho fabuloso" foi postado em maio.
    Outros abraços paraoaras!

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