domingo, 3 de março de 2013

Escolha da Palavra: o rio é rua, a ilha é o Paraíso

Aprendo com leituras e por aqui reaprendo a "palavramundo" das crianças da Ilha de Mosqueiro, alunado advindo de 13 localidades. Repenso a palavra e o contexto junto com os educadores de lá, porque “cada lugar é, ao mesmo tempo, objeto de uma razão global e de uma razão local, convivendo dialeticamente” (Santos, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção, Ed. Hucitec, 1996, p. 273). Essa população é urbano-ribeirinha-extrativista, exige-nos atenção ao discurso, importante escolha da palavra, conforme Paulo Freire, afinal, a palavra é um "signo social ideológico" (Bakhtin - Marxismo e filosofia da linguagem, 2004).

Amanheci com as histórias do povo daqui, aclimatada pelo inverno típico de Belém. Um sonhar acordado de olhos amanhecidos. Hum! ...a vida é sonho (La Barca, 2007) e tudo se mistura, e aí é preciso manter o caráter enigmático do sonho, segundo Benjamin (1984), por isso vou seguindo entre enigmas e aprendências.

Redescubro Mosqueiro nas matutinas idas pedagógicas para lá e enriquecida com o tempo das aprendizagens de lá venho da nossa Escola a Belém.

Chego às "palavramundo" de Paes Loureiro (Cultura amazônica: uma poética do imaginário, Ed. Cejup, 1991), no vai e vem das ondas da Praia do Paraíso, e entremeio aos barcos e à mata ciliar ecoam as palavras dessas águas pardas, por lá reli que os rios “escondem embarcações encantadas na manga de sua casaca de lendas, devora cidades, alimenta populações, guarda em suas profundezas ricas encantarias habitadas pelos Botos, Uiaras, Anhangás, Boiúnas, Cobra Honorato”.

E a música de Ruy Barata e Paulo André, vai nos reencantando no cenário da escola e no chão de assentamentos ou ocupações...

ESSE RIO É MINHA RUA

Esse rio é minha rua / Minha e tua, mururé/ Piso no peito da lua / Deito no chão da maré / Pois é, pois é.../ Eu não sou de igarapé / Quem montou na cobra grande / Não se escancha em poraqué / Rio abaixo, rio acima / Minha sina cana é / Só em pensar na mardita / Me alembrei de Abaeté / Pois é, pois é... / Eu não sou de igarapé / Quem montou na cobra grande/ Não se escancha em poraqué / Arresponde boto preto / Quem te deu esse piché / Foi limo de maresia / Ou inhaca de mulher? / Pois é, pois é... / Eu não sou de igarapé / Quem montou na cobra grande / Não se escancha em puraqué.



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