sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Nas águas da escrita: poerio poemar-se

O leitor é a pessoa de seu próprio autor. O ato da escrita é a experiência de um diálogo, árduo e difícil, primeiro entre o próprio autor e a ele mesmo como leitor de si-mesmo.

O eu é o crítico do que lê o que cria, e relê, critica e reescreve, alegra ou nega, desgosta, entra em crise, se esvai, volta, reformula, renova-se. E assim nesse fluir, se vai o processo...

Licenças às releituras, às pesquisas e suas escritas, abre-se às outras escritas, assim e por isso veio-me o olhar do rio... suas imagens, os cantos das pedras em suas interlocuções no leito desse rio que se deságua, ou mesmo nas ondas do rio-mar que transformado vai ao encontro das pedras que se espraiam na beira-mar. A veia incessante transborda enquanto se esvai, espalha vida por onde a correnteza se movimenta, leva histórias do leito à película e até o mar, misturam-se às águas plurais que lá borbulham e mostram as diferentes imagens dos lugares de onde tantas outras vieram e de novo se singularizam e juntas nutrem vidas e novas vidas. Planeta água. Conectados às tais águas por aqui desde que nascidos. Renova-se o milagre da vida. Sempre. Somos água. Barulhinho de água conforta. Relaxa. Tranquiliza.

E como nos diz Guilherme Arantes: “Águas que movem moinhos são as mesmas águas que encharcam o chão e sempre voltam humildes pro fundo da terra, pro fundo da terra”.

Se a poesia surge quando aparece uma pedra no meio do caminho do poeta, como não lembrar de Drummond, por isso, associando rio, pedra e poesia? Universo belo, mavioso, insólito, enigmático, embaraçoso, sequioso, amoroso, contraditório, caótico, cósmico. Esse é o nosso lar!

Pois é, Drummond em “À procura da poesia”, “penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos. Estão paralisado, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície intata. Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário (...) [Porém, digo eu neste intervalo] Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a Chave?”.

E agora José, dona Maria, e agora Você, volto enebriada por Drummond e quase findo com ele por aqui:

Repara: ermas de melodia e conceito / elas se refugiaram na noite, as [tais] palavras. / ainda úmidas e impregnadas de sono, / rolam num rio difícil e se transformam em desprezo”.

Mas, volto e renasço com ele em outro tempo:

Mundo mundo vasto mundo / mais vasto é meu coração (...)  não, meu coração não é maior que o mundo. / É muito menor”. (...) Fecha os olhos e esquece. / Escuta a água nos vidros, / tão calma, não anuncia nada. / Entretanto escorre nas mãos, / tão calma! Vai inundando tudo... / Renascerão... / Voltarão? / Meus amigos foram às ilhas. / Ilhas perdem o homem. / Entretanto alguns se salvaram e / trouxeram a notícia / de que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias, / entre o fogo e o amor. / Então meu coração também pode crescer. / Entre o amor e o fogo, / entre a vida e o fogo, / meu coração cresce dez metros e explode.

- Ó VIDA FUTURA! NÓS TE CRIAREMOS".


Para ouvir “À procura da Poesia” Drummond por Drummond, clique aqui.

Para ouvir Drummond em Mundo Grande, clique aqui.

Imagem 2: http://apact12a.blogs.sapo.pt/4622.html
Imagem 3:  arquivo pessoal, eu e minha filha Lígia, em Caiobá-Paraná.

4 comentários:

  1. Ai, Maria! Amo Drummond um monte!!! Quanta poesia embutida na realidade! Amo, amo amo!

    E sobre escrever, penso que a relação dialógica vai muito além da conversa do autor consigo. São nas conversas com o mundo que a escrita se realiza. O que eu discuto comigo são também olhares sentidos de outras falas, releituras da vida trazidas por brummond e tantos outros.

    Carinho em você, flor!

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  2. Isabele,

    Quanto prazer recebê-la de volta por aqui! Tenho estado um pouco ocupada, a exemplo de teu último post, às vezes o cansaço bate.

    Mais uma afinidade entre nós, Drummond - que bom!

    Concordo contigo somos plurais em nossa singularidade e singulares em nossa pluralidade. Bakhtin nos ajuda a entender esse dizer dialógico e discursivo de nosso ser, imagens caleidoscópicas na escrita, novos sentidos são sempre descobertos. E esta é a maravilha da poesia... recria-se nos leitores e a troca é mais fértil ainda.

    Adoro o cantinho da "Pedra do Sono", palavras que refrigeram e nos ajudam a poemar.

    Carinhos retribuídos em dobro!

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  3. Que texto legal!!!!

    Todos em UM
    Forte emoção,
    De encontrar as irmãs,
    UP’s e Sede,
    Em confraternização!

    Precisamos sentir a unidade,
    No diálogo diário,
    Nos caminhos, ruas e rios,
    Que nos levam ao prazer de ensinar.

    Agora, estamos aqui.
    Desafiados pelo tempo oportuno.
    Partindo o pão e bebendo o vinho.
    Juntos pela educação.

    É chegada a hora de ver o salvador nascer de novo.
    É novo tempo para cada um de nós,
    Ser Todos em UM,
    Buscar neste novo ano,
    A ponte da amizade e do bom ensino,
    Lutar pela dignidade e pela vida.
    Continuar vivendo e sentindo,
    O amor que nos une.
    Viva a Escola Bosque, viva cada um de nós.
    Felicidades!!!!!

    José Maria Andrade Filho, o Poeta das Ilhas
    17/12/2010

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  4. Pois José!

    Jutuba tem a felicidade de junto a você borbulhar as palavras que ali em suas nascentes saltam para por lá e aqui se fazerem vida e se misturarem nas costas e além do Atlântico. Águas que chegam às nuvens e se fazem felicidades em outras terras e mares. Que bom que você lá está e por isso digo em uníssono junto às tuas pautas, a Escola vivifica nos saberes que se atravessam, redescobrem e recriam palavras em linhas e em ondas d'água, e os versos ecoam, se multiplicam... O rio nutre o mar. Os ribeirinhos sabem disso e nós aprendemos com eles os segredos à beira-rio.

    Lá vai a barquinha...

    Que bom tê-lo por aqui presentificado!
    Presente virtuoso que se poema.
    Felicidades!!!!

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