Ressignificando “as flores tristes e baldias” e as nossas alegrias.
Autoria legitimada pelo Mestre. Vinícius chama Chico e diz “escreve aí dois versos” para a letra deste lindo choro e "vamos virar parceirinhos". Bem antes, Chico enganava seus pais que o mandavam dormir e, escondido atrás da porta, ouvia a conversa deles com o poeta. Nesse episódio, bem mais adiante, quebrou o gelo que fazia com que Chico apenas o admirasse, como amigo de seu pai, poeta e frequentador da casa, na vida e na arte. Após escrevê-los, mantinha-se receoso, e o poeta volta a lhe animar, na função de incentivador: "não, é isso mesmo", quando, o rapaz já casado, confessava ao dileto professor que nem mesmo sabia o que queria dizer com aqueles dois versos. Quem já não se sentiu inseguro na frente do Mestre? A obra fala sozinha?
Em 1969, juntos colocavam letra ao que Aníbal Augusto Sardinha, o Garoto, compusera em 1952. "Gente Humilde" foi uma espécie de presente em um momento ruim após o exílio de Chico em Roma.
Pela varanda
flores tristes e baldias /
como a alegria
que não tem onde encostar
Autoria legitimada pelo Mestre. Vinícius chama Chico e diz “escreve aí dois versos” para a letra deste lindo choro e "vamos virar parceirinhos". Bem antes, Chico enganava seus pais que o mandavam dormir e, escondido atrás da porta, ouvia a conversa deles com o poeta. Nesse episódio, bem mais adiante, quebrou o gelo que fazia com que Chico apenas o admirasse, como amigo de seu pai, poeta e frequentador da casa, na vida e na arte. Após escrevê-los, mantinha-se receoso, e o poeta volta a lhe animar, na função de incentivador: "não, é isso mesmo", quando, o rapaz já casado, confessava ao dileto professor que nem mesmo sabia o que queria dizer com aqueles dois versos. Quem já não se sentiu inseguro na frente do Mestre? A obra fala sozinha?
Em 1969, juntos colocavam letra ao que Aníbal Augusto Sardinha, o Garoto, compusera em 1952. "Gente Humilde" foi uma espécie de presente em um momento ruim após o exílio de Chico em Roma.
Pela varanda
flores tristes e baldias /
como a alegria
que não tem onde encostar
(os dois versos de Chico)
O ensinante aproxima o aluno, deixa de exibir conhecimento, afasta a distância posta, e assim possibilita ao aprendente pensar e expressar o que sabe enquanto se envolve e move a palavra. Segundo Fernández (2001), um ensinante só pode ensinar se aprende e um aluno só poderá aprender se ensina. O processo criativo brota com o Mestre. Poderia ser diferente, distante o ídolo vaidoso exibiria sua maestria e com o grau de poeta reforçaria ainda mais a “inibição cognitiva” do aluno, ao anular sua autoria de pensar, impediria de fazê-lo perceber-se capaz de compor como/com Ele. O sábio chama o discípulo e convida a compor junto. Esconde. Guarda. Silencia. Deixa-se levar. Uma ode ao devir. E aprende com aquele outro aprendente. O parceiro mais experiente se deixa ensinar pelos saberes que percorrem no discurso interno, internalizado, intenso e próprio, do mais novo parceiro, filho de seu amigo, o historiador Sérgio Buarque de Hollanda.
A partir deste ensaio, muitas outras parcerias vieram para nossa alegria. Assim são os mestres que sabem alternar lugar com os outros mestres presentificados em cada aprendente-ensinante.
O mestre, deste modo sadiamente, conhece e conhece que desconhece quando abre espaço para o outro dizer, criando oportunidades. Escreva aí dois versos - para aquela que já se constituía como um clássico da MPB. Na ocasião, não sabiam do sucesso, entretanto, para eles o choro já era alegria. Isso que importa aos que compõem, entrelaçam vida, emoções e sentimentos. Parcerias íntimas. A letra é a alma do poeta em verso. As letras, o multiverso cósmico em movimento.
Tempo de quaresma. Veio-me “Gente Humilde” da infância, quando lá o rádio animava as manhãs e tardes. E fui aprender com Chico e Vinícius a arte de ensinar e aprender que tece as relações entre professor e aluno, em seus gêneros, estilos, cultura e verdades.
Nossas artes mantêm um diálogo, resolvi tecer nova intertextualidade musical, agora com esta música de Chico Buarque, Vinícius e Garoto. Procurei ver o que este momento significou para Chico, e percebi que ele se faz renascer em outras músicas, esse revisitar traz novas emoções e sentimentos. A vida evolui?
Alude uma conversa melancólica e crítica entre “Gente Humilde” (“e eu que não creio, peço a Deus por minha gente, é gente humilde, que vontade de chorar”) e “Subúrbio” (esta composta em 2006), “lá tem Jesus e está de costas (...) a luz é dura (...) que futuro tem aquela gente toda?”. O Cristo está, de fato, lá no Rio de braços abertos para a área nobre, porém, de costas p’ro subúrbio.
Lendo “Subúrbio” deparamo-nos com o verso "é pau, é pedra, é fim de linha, é lenha, é fogo, é foda" tecendo intertexto com o refrão de "Águas de Março" (1972), de Tom Jobim, outra Paixão de Chico. De novo decorrem outras margens a novas interpretações e relações intertextuais. O fio da teia percorre, as autorias são de fato co-autorias. Releituras de leitores-escritores, aprendentes-ensinantes.
As aulas deixam de ser lineares e passam a transversalizar diferentes áreas e tornar possíveis novas autorias. Essa é a esperança, deixar de falar mal e fazer bem. É possível ser feliz na escola. Basta tecer competências, sensibilidade e maestria como a que nos ensina o Mestre/Sábio Vinícius. Quem é hoje o seu parceirinho?
"Gente Humilde"
O ensinante aproxima o aluno, deixa de exibir conhecimento, afasta a distância posta, e assim possibilita ao aprendente pensar e expressar o que sabe enquanto se envolve e move a palavra. Segundo Fernández (2001), um ensinante só pode ensinar se aprende e um aluno só poderá aprender se ensina. O processo criativo brota com o Mestre. Poderia ser diferente, distante o ídolo vaidoso exibiria sua maestria e com o grau de poeta reforçaria ainda mais a “inibição cognitiva” do aluno, ao anular sua autoria de pensar, impediria de fazê-lo perceber-se capaz de compor como/com Ele. O sábio chama o discípulo e convida a compor junto. Esconde. Guarda. Silencia. Deixa-se levar. Uma ode ao devir. E aprende com aquele outro aprendente. O parceiro mais experiente se deixa ensinar pelos saberes que percorrem no discurso interno, internalizado, intenso e próprio, do mais novo parceiro, filho de seu amigo, o historiador Sérgio Buarque de Hollanda.
A partir deste ensaio, muitas outras parcerias vieram para nossa alegria. Assim são os mestres que sabem alternar lugar com os outros mestres presentificados em cada aprendente-ensinante.
O mestre, deste modo sadiamente, conhece e conhece que desconhece quando abre espaço para o outro dizer, criando oportunidades. Escreva aí dois versos - para aquela que já se constituía como um clássico da MPB. Na ocasião, não sabiam do sucesso, entretanto, para eles o choro já era alegria. Isso que importa aos que compõem, entrelaçam vida, emoções e sentimentos. Parcerias íntimas. A letra é a alma do poeta em verso. As letras, o multiverso cósmico em movimento.
Tempo de quaresma. Veio-me “Gente Humilde” da infância, quando lá o rádio animava as manhãs e tardes. E fui aprender com Chico e Vinícius a arte de ensinar e aprender que tece as relações entre professor e aluno, em seus gêneros, estilos, cultura e verdades.
Nossas artes mantêm um diálogo, resolvi tecer nova intertextualidade musical, agora com esta música de Chico Buarque, Vinícius e Garoto. Procurei ver o que este momento significou para Chico, e percebi que ele se faz renascer em outras músicas, esse revisitar traz novas emoções e sentimentos. A vida evolui?
Alude uma conversa melancólica e crítica entre “Gente Humilde” (“e eu que não creio, peço a Deus por minha gente, é gente humilde, que vontade de chorar”) e “Subúrbio” (esta composta em 2006), “lá tem Jesus e está de costas (...) a luz é dura (...) que futuro tem aquela gente toda?”. O Cristo está, de fato, lá no Rio de braços abertos para a área nobre, porém, de costas p’ro subúrbio.
Lendo “Subúrbio” deparamo-nos com o verso "é pau, é pedra, é fim de linha, é lenha, é fogo, é foda" tecendo intertexto com o refrão de "Águas de Março" (1972), de Tom Jobim, outra Paixão de Chico. De novo decorrem outras margens a novas interpretações e relações intertextuais. O fio da teia percorre, as autorias são de fato co-autorias. Releituras de leitores-escritores, aprendentes-ensinantes.
As aulas deixam de ser lineares e passam a transversalizar diferentes áreas e tornar possíveis novas autorias. Essa é a esperança, deixar de falar mal e fazer bem. É possível ser feliz na escola. Basta tecer competências, sensibilidade e maestria como a que nos ensina o Mestre/Sábio Vinícius. Quem é hoje o seu parceirinho?
"Gente Humilde"
Outra bela parceria: "Águas de Março", com Tom Jobim e Elis Regina
Referência:
BUARQUE, Chico Buarque de. Tantas palavras: todas as letras e reportagem biográfica de Humberto Werneck. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
BUARQUE, Chico Buarque de. Tantas palavras: todas as letras e reportagem biográfica de Humberto Werneck. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Fernández, Alícia. A mulher escondida na professora: uma leitura psicopedagógica do ser mulher, da corporalidade e da aprendizagem. 2 reimpressão. Porto Algre: Artmed, 2001.
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Gostei da intertextualidade musical e me apaixonei pelo sininho tocando na página. rrss
ResponderExcluirQuero colocar um no meu blog.